Criando um personagem vegetariano/vegano - Estereótipos de veganos

domingo, 18 de outubro de 2020

 

Tradução: Eu quando alguém expressa o menor interesse no veganismo

Por: Thalita Gonçalves

Hello, little loafs!

Voltei neste quarto e último post sobre o vegetarianismo e veganismo! Já aprendemos sobre o vocabulário e a transição para o vegetarianismo; sobre o veganismo enquanto estilo de vida; e sobre alguns dos conflitos mais comuns criados quando se é vegano no meio de pessoas que comem carne. Hoje vamos ver os estereótipos mais comuns entre os veganos e/ou atribuídos aos veganos.

Só lembrando, mais uma vez, que não pretendo convencer ninguém a se tornar vegano, mas que essa série de posts são apenas algumas ideias sobre o veganismo reunidas para ajudar escritores. Essa lista não segue nenhuma ordem em particular.

 1. O anjo vegano:

Tradução: “Vocês vegans fingem que são melhores do que todo mundo”. Falso. Eu não estou fingindo.

Quem ele é:

É aquela pessoa essencialmente boa, que realiza trabalhos voluntários, ajuda todos que encontra, é a verdadeira encarnação de Madre Tereza de Calcutá e o veganismo é apenas a cereja no bolo desse anjo de candura (*sente a ironia~). Também conhecida como uma das muitas facetas dos nossos queridos Mary Sue e Gary Stu.

Como evitá-lo:

Não é porque uma pessoa é vegana que ela é um “anjo”, ou seja, que fará apenas coisas boas e corretas. Um vegano pode fazer coisas ruins de propósito, pode ter pensamentos equivocados, pode cometer erros. O vilão da sua história pode ser vegan! Não dizem que o Hitler era vegetariano (ou que só comia carne de frango)? E olha só o que ele fez!

Da mesma forma que pessoas que comem carne não consideram a vida do animal, um vegano pode fazer essa mesma dissociação com relação às pessoas. Por isso é importante considerar até que ponto o veganismo integra na vida desse personagem; o que ele compreende por abuso e exploração; como ele compreende abuso e exploração de animais; como o personagem separa humanos e animais.

 

2. O vegano revoltado: 

Tradução: “Mas você precisa de proteínas dos animais”. De acordo com a minha pesquisa você é cheio de merda.

Quem ele é:

É aquele que não respeita as escolhas e opiniões de outras pessoas, diz coisas que machucam apenas para provar que estão certos em suas escolhas, briga com qualquer um que ouse discordar de sua opinião.

Como evitá-lo:

É certo considerar que todos nós (não apenas veganos) temos nossos momentos revoltados, que discutimos com as pessoas com opiniões diferentes da nossa e eventualmente dizemos coisas que machucam. Faz parte de ser um ser humano passível de falhas e erros. Mas ninguém é revoltado o tempo todo.

Veganos têm seus momentos de revolta e depressão relacionados a inúmeros fatores da sociedade, principalmente porque têm consciência de que muitos problemas ambientais e sociais graves poderiam facilmente ser resolvidos se as pessoas parassem de consumir produtos de origem animal; mas um ponto importante a considerar é que queremos que mais pessoas se tornem veganas e sabemos que não é através da revolta e da violência que isso será alcançado.

Permita que seu personagem se sinta frustrado, triste, alegre, e toda uma gama de emoções humanas, pois antes de ele ser vegano, ele é um ser humano.

 

3. O vegano que gosta de (deitar e rolar com todos os) animais:


Tradução: Vacas sentando como cachorros é oficialmente a coisa mais importante.

Quem ele é:

Seu segundo nome deveria ser Dolittle, porque se entende com todos os animais, desde os domésticos até os mais selvagens. Pássaros pousam em seus dedos, animais super ariscos se aproximam com confiança, mesmo os mais violentos se tornam dóceis como filhotes de gatinhos quando próximos dessa pessoa. Só falta começar a cantar como a Branca de Neve na floresta, e fazer os animais limparem a casa para ela (o que, aliás, vai contra tudo o que o veganismo prega).

Como evitá-lo:

Enquanto muitos veganos são apaixonados pelos animais, se dão bem com eles, dedicam suas vidas inteiras ao ativismo e a santuários, animais continuam sendo animais e agindo como animais. Os ariscos continuarão ariscos, os violentos continuarão violentos, os dóceis continuarão dóceis.

Isso sem falar que, apesar de o veganismo ser sobre o fim da exploração animal, muitos veganos não se sentem particularmente comovidos pelo sofrimento animal, apenas decidiram fazer sua parte para parar com a indústria de criação e matança de animais (pode ser pela sua própria saúde ou pelo planeta).

Também é importante ter em mente que se o seu personagem é ovo-lacto-vegetariano sem a ambição de se tornar vegano um dia (ou seja, se o seu personagem não está em transição para o veganismo), ele não pode sê-lo pelos animais, uma vez que a indústria leiteira e de avicultura apenas adiciona uma etapa de exploração antes de matar os animais da mesma forma que seriam mortos se fizessem parte da indústria da carne.

 

4. O vegano ultra-master-super-hiper-mega saudável e perfeito: 

Tradução: Eles: Ah, você é vegan! Você deve comer de forma tão saudável e fresca!

Eu: Uh... Sim.

Quem ele é:

É aquela pessoa que não apenas é vegana, mas cozinha sem óleo, corre uma maratona, puxa ferro na academia, segue uma dieta paleo (é possível! Não me pergunte como, porque eu também não sei), sem glúten e sem soja. Se bobear também segue a política do zero-lixo, minimalista, neutraliza suas pegadas de carbono, só anda de bicicleta. Só falta a capa vermelha, porque essa pessoa é um verdadeiro herói.

Como evitá-lo:

Todos nós queremos ser assim um dia, mas sabemos que alcançar esse nível de proeza na vida é praticamente impossível. Se já é difícil ser apenas vegano, imagina ser tudo isso?! Chega até a ser meio assustador.

Permita que seu personagem tenha falhas e coloque uma ou duas dessas políticas como objetivos a serem alcançados. Por exemplo, sou vegana, tento (e falho miseravelmente) ser minimalista, mas praticamente não faço exercício nenhum e morro de preguiça de procurar receitas sem glúten, independente do que as pessoas falem sobre ser mais saudável ou não.

 

5. O vegano fraquinho e mirradinho: 

Tradução: Nenhuma carne? Você tem certeza de que está pegando proteínas o suficiente?

Quem ele é:

É aquela pessoa que se tornou anêmica depois da transição para o vegetarianismo/veganismo.

Como evitá-lo:

Olha, em oito anos de ovo-lacto-vegetarianismo e dois de veganismo, nunca conheci uma pessoa sequer que tenha se tornado estritamente vegetariana e se tornado anêmica. Aliás, todas as pessoas anêmicas que conheci se alimentavam com carne diariamente. Deficiência de proteína?! Nunca ouvi falar de tal condição e não faço a menor ideia de como seria uma pessoa com esse problema de saúde.

Claro, vegetarianos estritos precisam fazer reposição de vitamina B12, mas isso também vale para cerca de um terço de toda a população que come carne (e acham que só porque comem carne também repõem suas necessidades diárias dessa vitamina e de ferro).

É muito mais comum que uma pessoa que se torna vegana tenha suas condições de saúde melhoradas e existem até relatos de pessoas que reverteram alguns tipos de câncer e problemas cardíacos graves apenas com essa mudança na dieta. O mesmo deve acontecer com o seu personagem.

 

6. O vegano sem noção que não sabe cozinhar:


Tradução: Acabei de fazer meu famoso cheeseburger vegano, sem laticínios e sem glúten!

Quem ele é:

É aquele cara que leva no churrasco da empresa uma lasanha de alface e tomate (lê-se: alface e tomate dispostos em camadas) e que só se alimenta de salada verde.

Como evitá-lo:

Lembre-se que os veganos querem mostrar que não vivem apenas de salada e esse é um estereótipo que o público vegano quer quebrar! Um vegano se alimenta, muitas vezes, com maior variedade do que uma pessoa que come carne, pois inclui em sua alimentação sementes, grãos, vegetais variados, frutas variadas etc.

Além do mais, se os veganos querem mostrar que comem tão bem quanto qualquer pessoa, eles não irão levar para o churrasco da empresa uma salada verde. Ao invés disso, farão questão de levar um prato bem saboroso que irá agradar a todos os paladares.

 

7. O vegano que virou vegano do dia para a noite e nunca mais olhou para trás:

Tradução: Quando alguém diz que nunca experimentou nada vegano. Você nunca comeu uma maçã?

Quem ele é:

Aquele que todo vegano deseja ser, mas dá para contar na mão os que são realmente assim (eu não conheço nenhum).

A verdade é que normalmente a transição para o veganismo é feita aos poucos, por exemplo, primeiro para-se com as carnes vermelhas, depois as brancas, depois o ovo, depois leite; e muitas vezes esse caminho é feito em zigue-zague, ou seja, a pessoa volta a comer produtos de origem animal em algum momento, depois para novamente e depois volta e então para e assim por diante até finalmente parar de vez.

Como evitá-lo:

Como já falei antes: permita que seu personagem possua falhas. Sucumbir a um desejo por um produto de origem animal, especialmente se for algo que o personagem realmente goste, como um queijo ou um doce ainda não “veganizado” ou cuja versão vegana simplesmente não é tão gostosa assim, é perfeitamente normal.

A filosofia e o modo de vida veganos são “normas” que a gente procura colocar sobre nossos corpos, mas resistir à tentação, principalmente nos dias de hoje, não é exatamente fácil. Nem sempre a mente vence a matéria.

Tem um youtuber vegano que em todo natal se permite comer um doce que a avó faz que possui ingredientes de origem animal, para não deixar a avó triste (mas principalmente porque o doce, segundo ele, é divino). Comer ou não o doce não o faz menos ou mais vegano. Isso também vale para o seu personagem.

 

8. O vegano hippie/natureba: 

Tradução: Trols são tipo: “vai abraçar uma árvore, seu vegano estúpido.” E eu sou tipo “não se importe se eu for”.

Quem é:

É aquele vegano paz e amor, que usa roupas tingidas com casca de alho e cebola, nada sintético jamais tocou seu corpo e poderia muito bem estar em Woodstock.

Como evitá-lo:

Não é porque uma pessoa se tornou vegana e se importa com os ingredientes dos produtos que usa que irá voltar aos anos 1960. Claro, ser hippie ou natureba pode ser uma característica do seu personagem, mas ele não o será única e exclusivamente por causa do veganismo.

Lembre-se de respeitar as características do seu personagem e de dar um tempo de transição caso ele decida mudar. E tenha em mente que seu personagem está inserido na comunidade da sua história, ou seja, que ele irá se importar com a opinião daqueles mais importantes.

Dessa forma, seu personagem pode ser hippie e/ou natureba e ser vegano. Mas um não é a causa do outro e seu personagem não irá se tornar hippie e natureba da noite para o dia. Se seu personagem tiver essas características anteriores à escolha pelo veganismo, ótimo! Se ele se torna hippie e natureba, isso deverá incluir um período de transição para manter a congruência do seu personagem.

 

9. O vegano socialista/anticapitalista/comunista:

Tradução: Passando pela seção de carne tipo...

Quem é:

O título é autoexplicativo.

Como evitá-lo:

Veganos normalmente tentam trabalhar dentro do capitalismo para tornar a sociedade vegana. Isso inclui: comprar produtos veganos de grandes corporações, sempre que puder, independente do preço; e comprar produtos com selos veganos de multinacionais, sempre que puder, independente do preço. Como já expliquei nesse post, a ideia é incentivar a produção de opções veganas que sejam do agrado da maior parte da população, uma vez que a agropecuária está literalmente matando nosso planeta.

Claro, muitos veganos, além da consciência ambiental e política, também têm uma maior consciência econômica e de classe e conhecem os principais problemas do capitalismo. Também é importante ter em mente que alguns veganos também são socialistas ou anticapitalistas ou comunistas.

Seu personagem pode ser socialista ou anticapitalista ou comunista, mas ele não o será por causa do veganismo. Como eu já disse: um não é a causa do outro. Lembre-se que o veganismo é sobre a não exploração e não massacre de animais, mas não é sobre política ou economia (apesar de usá-los em seu favor, quando necessário).

Da mesma forma que seu personagem tem uma razão forte para ser vegano no meio de uma sociedade carnista, ele também deverá ter uma razão forte para defender o socialismo/comunismo/anticapitalismo numa sociedade que praticamente tem fobia dessas teorias. E lembre-se de pesquisar sobre esses movimentos antes de usá-los, para não cair no erro de criar uma história superficial e preconceituosa.


E é isso, pessoal!

Espero ter ajudado os autores com esses pontos de partida sobre o movimento vegano e a introduzir o mundo vegano para aqueles curiosos. E, lembre-se, você não precisa usar tudo o que coloquei na série de posts na sua história; use apenas o que for importante para compreender seu personagem e para o seu plot.

Também não fique confortável com as informações que coloquei aqui. Esse assunto está longe de estar acabado. Pesquise mais, entre nos links que coloquei nos posts, assista aos documentários, especialmente se você não for vegano. Mas, acima de tudo, respeite seus personagens, suas histórias e seus modos de pensar.

Boa pesquisa!

Boa escrita!

See ya! 




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