Por: Musa
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Bem-vindos,
queridos leitores. Estou de volta com a continuação dessa série de utilidade
pública para nos ajudar a retratar corretamente relacionamentos abusivos na
escrita.
Até agora,
aprendemos como escrever relacionamentos saudáveis e o ciclo do abuso. Tudo
isso para termos uma ideia generalizada de como esse tipo de relações funciona
e como distingui-las das saudáveis ou apenas disfuncionais.
Neste post,
vou estar explicando os tipos de abuso, pois é. Existem vários tipos, uma
relação abusiva pode funcionar de várias maneiras e ter mais que um tipo de
abuso em simultâneo. Tudo vai depender do tipo de abusador que você pretende
escrever, assim como o tipo de relação que ambos os personagens têm.
A
importância deste post não é descrever as reações da vítima e do abusador ao
exercer ou sofrer os diferentes tipos de abuso, e sim compreender do que se
trata e o que os torna abusivos em vez de apenas casos isolados ou
disfuncionais. A mentalidade da vítima e do abusador por trás ou após o abuso é
algo muito complexo que deverá ser desenvolvido através da pesquisa do autor.
Existem
várias niches de abuso e algumas delas podem ser incluídos em tipos mais
abrangentes. Então vou resumir no seguintes: Abuso Emocional, Abuso Físico,
Abuso Sexual, Abuso Financeiro e Abuso Espiritual.
Vamos lá!
Abuso Emocional
Há uma razão
porque decidi abordar este tipo primeiro:
Ao contrário
dos outros tipos de abuso, que são facultativos para constituir uma relação
abusiva, o abuso emocional não pode, de jeito nenhum, não existir. Este tipo
está na génese de qualquer relacionamento abusivo. Sem ele, não existe o abuso
nem a possibilidade do abuso manter-se.
Como falei
no post anterior, o ciclo de abuso é constituído por um abuso emocional
integrado. Ele é o combustível deste tipos de relacionamento. Ou seja, se você
se pergunta se a relação que escreve é abusiva, disfuncional, ou apenas mal
escrita, tem que começar pelo abuso emocional e se ele está ou não presente, se
está ou não desenvolvido.
Portanto,
comece por ele.
Os outros
tipos de abuso são apenas maneiras que o abusador procura para atingir a vítima
de formas em que o emocional não é suficiente, ou é aquele que consolida ou
banaliza as atitudes dos outros tipos de abuso. É aquele que quebra e molda a
vítima ao gosto do abusador.
O abuso
emocional é constituído ou realizado através de outros tipos mais pequenos,
como o verbal. O abusador usa palavras como armas para a vítima, ela começa a
acreditar nas suas mentiras; fazendo-a acreditar que é estúpida, doida, que ninguém
a vai querer, que ninguém a ama/aguenta. Isso pode existir na vítima antes, e o
abusador aproveitar-se, ou podem ser inseguranças que são inseridas na vítima
após ouvi-lo por tanto tempo. Estas mentiras vão deixar a vítima isolada, pois
ninguém a quer por perto, ou impossibilitá-la de falar acerca do seu abuso, por
pensar que merece ou é doida e está exagerando.
Não apenas
por palavras, pequenas ações ajudam a promover este abuso. Coisas como mover
pertences da vítima e dizer que sempre estiveram ali, negar que certas coisas
aconteceram, diminuir ou distorcer as palavras da vítima — especialmente se
está queixando-se de algo que o abusador fez. Acontece através de um sistema
longo e consistente, vai fazer a vítima duvidar da sua própria sanidade. O que
gera mais isolamento ou fá-las sentir que ninguém vai acreditar nelas se falar
no que está acontecendo, afinal elas nem se lembram onde deixaram as chaves de
casa, não é mesmo?
Muito se
pode dizer sobre este tipo de abuso e a sua importância, apenas saiba que não
pode esquecer-se dele, pois é a cola que deixa tudo juntinho.
Quando for
escrever um relacionamento abusivo sem desenvolver uma base cíclica, constante
e bem fundada em abuso psicológico e/ou emocional, os seus relacionamentos
abusivos vão parecer superficiais e não acreditáveis.
Este é o
abuso que vai seguir a vítima por mais, tempo, o físico, sexual, financeiro,
são palpáveis e visíveis, podemos afastar a pessoa que magoa a vítima e
terminá-los. Porém o emocional permanece, por vezes permanentemente, muito
depois da vítima sair da situação. Ele vai moldar o trauma e sua mentalidade
dali para a frente.
Então
pesquise muito sobre, não pense que pode adivinhar o que é passar sobre esse
tipo de abuso sem tê-lo vivido; e desenvolva-o antes de qualquer outro.
Abuso Físico
Este é o
mais visível e, normalmente, aquele em que pensamos quando vemos a palavra
“abuso”. Às vezes, até mesmo relações que não envolvem este tipo de abuso nem
são consideradas abusivas ou “abusivas o suficiente”.
Não existe
muito a dizer sobre o que acontece no abuso físico, ele inclui machucar alguém
com ou sem objetos (atirar coisas como vasos, usar armas, etc.); também inclui
sufocar, invadir o espaço pessoal e até mesmo a ameaça de comprometer a
integridade física da vítima através de coisas como conduzir sem cuidado,
tornar os espaços onde ela se encontra inseguros, escorregadios, tóxicos, tudo
o que é deliberadamente feito pelo abusador para magoar a vítima fisicamente é
considerado abuso físico.
A violência
pode estar presente em várias situações e relações, o que a torna abusiva é
haver claramente uma vítima e um abusador consistentemente, no caso, não quer
dizer que a vítima não retalie uma vez ou outra, mas ela sempre sai com um
castigo muito maior se se atreve a fazê-lo. Também existe o facto que a
violência é usada pelo abusador como demonstração de uma frustração por não
conseguir o que quer da vítima através dos métodos não violentos (abuso
emocional). Ou talvez seja o abuso físico nascente de problemas em lidar com a
raiva, consumo de substâncias, e então o abuso emocional segue-se para que o
comportamento seja banalizado.
O que se
deve ter em consideração descrevendo abuso físico é encontrar a lógica que o
seu abusador tem para usá-lo, por que ele o usa? Em que situações? Como ele faz
depois de um episódio para que a vítima permaneça com ele? Quais os seus
gatilhos? Como ele justifica fazer isso para si mesmo? Isso são tudo
particularidades de uma relação abusiva, em oposição à violência disfuncional
ou entre estranhos e rivais, que não tem um cariz manipulador e cíclico.
Portanto,
quando escreve abuso físico, tenha em consideração que este é visível e
portanto terá que trabalhá-lo muito bem para a vítima permanecer com o abusador
ou os amigos e família não intervirem.
Abuso Sexual
O Abuso
sexual merece estar numa categoria diferente do físico pelos componentes
altamente emocionais, o cariz único sentimental que existe no ato sexual e a
maneira como está diretamente relacionado com a autonomia da vítima.
Ele pode
existir em qualquer tipo de relação abusiva, qualquer dinâmica ou natureza da
relação. E o trauma é diferente para as vítimas de contextos diferentes, abuso
sexual entre familiares e entre parceiros românticos vai gerar uma miríade de
sentimentos distintos que devem ser estudados separadamente dependendo do que
for tratar.
Pesquise
sobre a experiência da vítima na perspectiva do papel que o abusador tem na
vida dela, pois influencia muito o trauma.
Este tipo de
abuso existe, como muitos sabem, através da violação, o ato sexual não
consentido. Novamente, de uma maneira abusiva, isto acontece sempre com uma
vítima e um abusador, os papéis não mudam, pois numa relação abusiva o poder
está bem estabelecido.
Da mesma
forma que o abuso físico, o abusador pode usar o sexo como uma arma para
manipular e desarmar a vítima de formas que o abuso emocional não consegue.
Isto é, fazê-la sentir que sexo é tudo para que serve, que não tem o direito de
dizer não pois o sexo é um direito (comum em casos de relacionamentos
românticos abusivos, especialmente entre personagens casados), ou também forçar
situações ou atos sexuais que a vítima não deseja ou sente-se confortável a
fazer pois é o que precisa para satisfazer o parceiro e humilhá-la se não
conseguir ou quiser fazê-los.
A pressão
para ser melhor no sexo, que nunca é bom suficiente, também faz parte do abuso
sexual. O ato sexual é sempre, de um jeito ou outro, íntimo e repleto de
reações biológicas e emocionais automáticas do nosso corpo. O que gera
sentimentos muito confusos e nocivos para uma vítima de abuso sexual, pois algo
inerentemente relacionado à autonomia da pessoa está sendo usado contra ela,
está sendo roubado dela.
Isso gera um
trauma complicado com repercussões complexas e profundas. Mais uma vez, se você
nunca foi vítima de abuso sexual, não tente adivinhar o que passa pela cabeça
de quem foi, pesquise diretamente a história de vítimas da boca delas para
poder narrar melhor este tipo de trauma.
Abuso Financeiro
Afinal, a
partir do momento que sua história se passa num universo capitalista, o
dinheiro dita muita coisa acerca da independência e liberdade de uma pessoa. E
é de esperar que um abusador fosse querer tirar partido disso ou controlar essa
vertente da vida da vítima.
É algo mais
comum em casais e relacionamentos abusivos entre pais e filhos. Pois
normalmente existe uma partilha de bens ou dependência econômica entre ambos.
Para além
disso, tem que se entender que esta dependência econômica é muitas vezes o que
impede a vítima de sair da relação.
Como
funciona? De várias maneiras, o abusador pode impedir a vítima de arranjar um
trabalho e consequentemente deixar todos os fardos financeiros a seu cuidado.
Também pode não deixar a vítima ter acesso à sua conta bancária ou ter algum
poder de decisão sobre o orçamento ou finanças, isto pode ser usado como abuso
emocional ao fazer a vítima sentir-se incompetente para tais tarefas.
Também pode
o abusador entrar em dívidas em nome da vítima, arruinando a sua situação
econômica, o que pode impedi-la de arranjar nova habitação, transporte, ou
fugir.
Este é um
tipo de abuso muito materialista, o trauma que resulta dele normalmente é
apenas associado ao emocional. Ele arruína as coisas materiais para a vítima, e
não tanto o seu interior por si. Mas não deixa de ser um fator importante
pensar na situação econômica dos seus personagens quando for escrever e como
interfere com o ciclo abusivo.
Abuso Espiritual
Também pode
ser conhecido como abuso religioso ou cultural, é encontrado em relações onde
um ou ambos os personagens possui crenças religiosas, superstições ou uma
cultura diferente ou iguais ao abusador.
É um sistema
abusivo de comportamentos contínuos onde o abusador ridiculariza, banaliza e
humilha a vítima na procura da sua espiritualidade, ou comportamentos
religiosos e culturais, fazendo-a sentir-se mais isolada. Também acontece o
abusador não permitir que a vítima participe de eventos culturais particulares
dela, ou ir na igreja ou local de adoração específico. Como mencionado, é uma
técnica para deixar a vítima isolada e retirar o lugar de Deus da sua vida,
assim como afastá-la da sua comunidade para não haver espaço para alguém acima
do abusador na vida dela.
Outra
maneira que o abuso se manifesta é a contrária, se o abusador também é
religioso ou parte de uma cultura igual à da vítima. Ele pode constantemente
usar suas crenças para manipular a vítima, fazê-la sentir que o que faz para
adorar o seu Deus ou honrar seus anciãos nunca é suficiente. É muito comum
entre pais e filhos, por exemplo.
Também é
possível o abusador usar a parte da identidade da vítima como ameaça, no
sentido ameaçar revelá-la para pessoas que não sabem ou podem colocá-la numa
posição de perigo.
Isto faz a
vítima sentir-se em constante dívida para com Deus e sua cultura. O que a torna
fácil de convencer a fazer coisas que o abusador quer para aliviar essa
sensação.
É tudo por
esse post. Podemos compreender as várias maneiras como o abuso se manifesta,
tendo em consideração que o abuso emocional é o único que terá que estar sempre
presente para constituir uma relação abusiva.
Entendemos
também que para tratarmos estes comportamentos como abusivos em vez de casos de
violência isolados, eles têm que acontecer consistentemente, por algum período
de tempo com um ciclo semelhante ao que mencionamos no post anterior.
Espero que
tenham gostado, nos vemos no próximo!
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