Quem Tem Ranço da Jornada do Herói - Parte 2/3

segunda-feira, 8 de abril de 2019
Por: Asthera Maxwell 
Perfil: https://fanfiction.com.br/u/243608/



Olar, pessoas!

Bom, vamos compensar o imenso atraso do post com uma intro bem rapidinha!

Hoje vamos falar sobre o que propus a vocês no primeiro post. Afinal, sem personagens, a jornada do herói não anda, né?

Mas como nasce um herói? Como ele é no começo e no que ele se transforma durante a jornada? Veremos arquétipos no post de hoje, e, melhor ainda, arquétipos que a gente não lê todo dia por aí! ARQUÉTIPOS MASCULINOS.

Vem comigo!


1 - RELEMBRANDO ARQUÉTIPO X ESTEREÓTIPO: NÃO É A MESMA COISA!

Só pra relembrar. Arquétipo pode ser traduzido como um determinado padrão de comportamento da sociedade, que foi identificado em lendas, mitos e histórias antigas pelos estudiosos da área. Ou seja, não tem diferentão aqui, todos os arquétipos já apareceram em algum momento na história da humanidade. Exemplo de arquétipo: Mago.

Estereótipo é o modo como esse padrão é abordado nas histórias. Suas características internas e externas, digamos assim. Exemplos de estereótipo de Mago: Gandalf, Merlin, Dumbledore. Todos barbudos, com roupas longas, velhos, enfim.



2 - ARQUÉTIPOS MASCULINOS: ETAPA 1 (CRIANÇA DIVINA, CRIANÇA PRECOCE, CRIANÇA EDIPIANA E HERÓI)

Você pode falar o que quiser de religião, mas é impossível negar o papel importante que ela tem, seja para o bem ou para o mal. Aqui vou focar no que ela tem de bom.

As religiões são um bom exemplo de estabelecimento de arquétipos. Pode ver que todas elas possuem uma criança divina: Jesus, Moisés, Buddha, Shiva, Zeus, Arthur; ou seja, não adiantou você brigar com aquele parente chato na ceia de natal para ver quem deles veio primeiro, todo mundo tem seu modo de representar o mesmo arquétipo e tá tudo bem.

Nesse post, apresentarei os arquétipos masculinos infantis, então, eles ainda não estão maduros e apresentam forte ligação com a figura da Mãe e o que ela representa para eles, antes de passarem pelo arquétipo do herói que será seu divisor de águas para que se tornem homens. Os arquétipos são: criança divina, criança precoce, criança edipiana e Herói.

Cada um dos três possui dois “sub-arquétipos” que compõem sua sombra, ou seja, as nuances que os arquétipos adquirem se vividos em excesso ou em falta. Importante ressaltar que os arquétipos infantis podem ser vividos mesmo na fase adulta, então não se preocupe se encontrar um cara agindo como tirano da cadeirinha alta por aí.

Por mais reprováveis que os comportamentos sejam na vida real, na literatura é um campo farto para seus personagens, afinal, ninguém gosta de personagens planos! Então, julgamentos à parte, use-os tanto para desenvolver sua jornada de redenção, quanto para fazê-los afundar ainda mais!


2.1 - CRIANÇA DIVINA




O primeiro estágio, portanto, mais primitivo do masculino imaturo. Ela pode ser definida da seguinte forma: todo-poderoso, o centro do universo, mas, ao mesmo tempo, indefeso e frágil. Entre outras coisas, ele representa a fragilidade, mas também o propósito da ordem que seu nascimento representa (segundo os autores, Cristo pode ser considerado um exemplo, sendo ele o elemento da ordem e os animais que acompanharam seu nascimento, os impulsos primitivos agora já controlados). É o arquétipo infantil que antecede o arquétipo maduro do Rei. Segundo Freud, são pulsões "primitivas" ou "infantis", amorais, enérgicas e cheias de pretensões divinas. Impulsos impessoais, preocupados apenas com as necessidades ilimitadas da criança.

Para Adler, é um complexo de superioridade oculto que encobre nossos sentimentos de vulnerabilidade, fraqueza e inferioridade. Já estudiosos de Jung, que inclusive é elemento importante que influenciou os arquétipos literários que conhecemos hoje, pensaram de outra maneira. Para eles, a Criança Divina é nossa fonte de vida, de características mágicas que dão poder. Entrar em contato com elas gera sensação de bem-estar, entusiasmo pela vida, criatividade, beleza e grande paz e alegria.

Acima de tudo, a Criança Divina representa também renovação. Se seu personagem já está numa posição de liderança, ou vai desenvolvê-la, é importante que ele não se esqueça desse aspecto. Afinal, sem essa ligação com a sua criança divina interna, não há como ele promover o potencial de sua ideia/causa/propósito e ele descerá na curva de desenvolvimento, sentindo-se vazio e incapaz.

2.1.1 - O TIRANO DA CADEIRINHA ALTA: Uma das sombras da Criança Divina. Nesse caso, é a sombra que peca pelo excesso. O mimado que quer tudo e nada, que as coisas sejam feitas do jeito que ele quer e quando ele quiser, caso contrário, preparem-se para o espetáculo. É aquela criança que limpa o chão do mercado fazendo birra porque a mãe não compra o que ele quer. E, quando adulto, o cara arrogante que acha que o mundo gira ao seu redor, e é tudo sobre ele. Nunca está satisfeito consigo mesmo, nem com os outros; o perfeccionista que centraliza tudo, que se as coisas não forem feitas do jeito dele, nunca vão funcionar. Explosões de raiva são suas armas mais frequentes.

2.1.2 - O PRÍNCIPE COVARDE: A outra sombra, mas que peca pela falta. Enquanto o tirano vive num pedestal, o príncipe vive numa redoma. Sabe aquele seu irmão mais novo que aprontava o céu e o inferno em casa, mas que quando o bicho pegava, corria pra saia da sua mãe e jogava a culpa em você? Ta aí, você tem um Príncipe Covarde em casa. O príncipe é um ótimo manipulador, é o mimado que vive reclamando de tudo e de todos, não tem iniciativa nenhuma e a família vive em função dele, tornando-o pior que o tirano, pois o primeiro já mostra a cara e você já sabe como lidar. Aqui, não é com ele que você lida, mas sim com aqueles que ele manipula. Nada impede que ele dê uns ataques de fúria como acontece com o tirano, mas a maior arma dele é se fazer de coitadinho, e se o seu personagem tiver alguém pra bajulá-lo, mesmo estando errado, terá um prato cheio na história.


2.2 - CRIANÇA PRECOCE

  
Resumidamente, é a criança prodígio. Frequentemente aprende a ler cedo (em especial para responder as próprias perguntas), quer saber o "como, quê e onde" de tudo. Saber/conhecimento é praticamente o que faz sua vida ter sentido, independente do que ela precisa superar para adquirir mais. É o arquétipo que permite ter coragem de explorar, iniciativa, desbravar o desconhecido, manter viva sua curiosidade e a dos outros também. Costuma ser bom em várias coisas, mesmo que não sejam áreas afins. Tende a ser introvertido, mas ele se torna mais aberto com aqueles que se interessam pelo conhecimento, aprender e compartilhar. É o arquétipo infantil que antecede o arquétipo masculino maduro do Mago.

2.2.1 - O TRAPACEIRO SABICHÃO: A sombra do Precoce, que peca pelo excesso. Se por um lado, sua energia é extremamente importante no que se diz respeito a expor as mentiras e derrubar aqueles que as contaram, pode ser muito nociva. É o chamado agressivo-passivo, que só quer expor a galera, ver o circo pegar fogo, mas não tomar o lugar do dono do circo e resolver o incêndio. É o que sabe tudo e adora mostrar que sabe, que é superior aos outros por isso. Também pode ser aquele que faz aquelas brincadeiras de mau gosto, o que expõe a "burrice" dos outros com elas e exalta a própria inteligência. É o que acredita que todo mundo é corrupto, mas nunca assume as próprias responsabilidades (como eu disse lá trás, ele não quer resolver o incêndio, só quer causá-lo). É o que domina as conversas, o que interrompe, o que tenta invalidar seus argumentos e transforma discussões amigáveis em sermões, mas também é aquele cara que, se for mais Sabichão que Trapaceiro, te coloca no seu devido lugar quando você acha que sabe tudo. É o que abaixa tua bola quando você se acha a última coca-cola do deserto. Em geral, esse comportamento surge e se acentua quando a pessoa é rebaixada, criticada, agredida emocionalmente pelos outros e o fato de não se sentir especial a torna presa fácil para esse arquétipo, que pode reforçar sua necessidade de se sentir especial, mostrando-se tão esperto ao ponto de usar sua inteligência para passar as pessoas pra trás.

2.2.2 - O PALERMA: A sombra que peca pela falta. É aquele que, na sala, você só percebe que existe porque ele responde a chamada, porque em geral é descrito como indiferente, ingênuo, lerdo, raciocínio lento e frequentemente é alvo de zombaria e desprezo dos colegas. Porém, o Palerma frequentemente percebe mais do que demonstra e seu comportamento pode mascarar sua grandiosidade/vulnerabilidade, tornando-o perigosamente propenso a desonestidade, afinal ele não sabe de nada.


2.3 - A CRIANÇA EDIPIANA


Vimos até agora um padrão entre os arquétipos: a importância da mãe como aquela que supre as necessidades do filho, que ainda apresenta seu arquétipo imaturo. Vimos também o que acontece quando a mãe falha nisso, na opinião dele, tornando-o um Tirano ou um Príncipe. A criança edipiana está, por falta de uma frase melhor, acima de tudo isso. Embora os três arquétipos estejam ligados à espiritualidade por intermédio da mãe terrena, não é a sua mãe terrena que a criança edipiana anseia, mas sim ao aspecto materno da criação, do amor, da nutrição, da espiritualidade, beleza e sensibilidade presente em todas as criações humanas. O senso místico de unidade retratado pelo culto à Grande Mãe em várias culturas. A criança edipiana não vivencia totalmente seu masculino nutridor, mas é capaz de vivenciar os aspectos positivos deste. É terno, afetuoso, com fortíssima ligação com a espiritualidade. É o arquétipo infantil que antecede o arquétipo amadurecido do amante.

2.3.1 - O FILHINHO DA MAMÃE: A sombra que peca pelo excesso dessa busca pela Mãe. Para ilustrar, usarei as Crônicas de Gelo e Fogo. Na série isso não acontece, só nos livros. Após a morte da mãe, Sweetrobin (Robert Arryn) fica muito ligado a Alayne Stone, que ao mesmo tempo em que se torna uma substituta da mãe pra ele, vez ou outra você o vê dizendo que Alayne é dele, que quer casar com ela e coisa parecida, justamente porque ele sabe que o querem morto e de quebra, a ideia de qualquer um chegar perto dela, em especial o “rival” dele, Harry, é insuportável. É desse tipo de comportamento que se trata o filhinho da mamãe.
Segundo Moore e Gillette (1993), no ponto de vista do desenvolvimento, o pai é deus e a mãe, a deusa, e a busca inconsciente pela vivência do espiritual se torna mais forte quando essa figura paterna não existe. Outra característica dele, em busca dessa beleza, ternura, satisfação transcendental que só a "Grande Deusa" poderia oferecer é ele se tornar um Dom Juan, porque nenhuma mortal consegue preencher esse anseio, então o cidadão pula de uma mulher para outra nesse anseio pelo feminino transcedental.

E como não podia deixar de ser, o filhinho pode se tornar um compulsivo sexual, se        masturbando compulsivamente, no desespero de vivenciar o poder do seu falo, o seu poder      da criação. Assim como a infinidade das formas femininas são representações da Deusa, o    filhinho da mamãe pode ter essa fixação por unir-se a ela, tornando-se/vivenciando o     "Grande falo" ao conhecê-las, seja pela pornografia, seja se deitando com quantas mulheres conseguir.

2.3.2 - O SONHADOR: O filhinho da mamãe pelo menos buscava a Mãe. Em excesso, mas buscava. O Sonhador não faz isso, pode-se dizer que ele tem consciência da sua condição terrena e que nunca será capaz de alcançá-la justamente por isso. Ao levar ao extremo os impulsos espirituais da Criança Edipiana, ele se deixa levar tanto pela passividade, que se isola dos relacionamentos humanos. Seu mundo imaginário é mais importante e interessante do que o mundo real, parecendo ser reservado e deprimido e isso pode se transferir para seus sonhos também, tornando-os melancólicos ou etéreos. Seu comportamento isolado demonstra o ressentimento por não ter a posse da Mãe, a grandiosidade que os arquétipos imaturos possuem, no arquétipo do Sonhador aparecem como melancolia ou depressão.


2.4 - ARQUÉTIPO DO HERÓI


Eu poderia explicar o herói em duas vertentes, a do storytelling (a que surgiu com os gregos, blá blá whiskas sachê) e a psicológica. Por enquanto, vou focar na psicológica porque o herói como arquétipo do storytelling precisa de um estudo que o post atual não comportaria, olha só o tamanho dele!

As energias do herói surgem como um divisor de águas para os arquétipos imaturos. O arquétipo do Herói, apesar de também ligado a Mãe, surge para despertar o masculino dentro do menino, preparando-o para o que o mundo trará como desafio. É o arquétipo que joga o menino na parede e canta “I'll make a man out of you” pra ele, o que permite que o menino se afirme e se defina como uma pessoa e suas particularidades, para que possa se relacionar com os outros. No mundo atual, que não se lembra mais dos seus heróis, esse momento é imprescindível para que o menino não se deixe levar pela preguiça, pelo egoísmo ou a inveja, sentimentos que podem levá-lo a regredir para algum dos arquétipos-sombra apresentados. Ele reconhece suas falhas e que precisa dos outros, coisa que o Valentão exibicionista e o Covarde não sabem fazer.

2.4.1 - O VALENTÃO EXIBICIONISTA: O arquétipo que a gente mais vê nas histórias. O nome já dispensa descrição. O menino/homem que quer impressionar os outros, o valentão que age sozinho para conseguir as glórias para si, mas as consequências dos seus atos quando eles dão errado são coletivas. O que se acha a última coca-cola do deserto e se acha no direito disso; o que tem o ego inflado, mas na verdade não passa de alguém covarde e inseguro. Essa sombra do herói, quando vai enfrentar o dragão, ou sai queimado, ou descobre-se incapaz de amar a princesa que resgatou, significando que alguma coisa deu errado no seu processo de despertar do masculino. Quando influenciado por esse arquétipo, ele ainda está ligado à Mãe, mas precisa superá-la desesperadamente. O herói, em geral, é especialista em negar a morte, por mais que a gente esfregue "momento morri" na cara dele, ou Hades arremesse nele a placa com as palavras de boas-vindas do Inferno de Dante, ele continuará tampando os ouvidos e cantando lalala.

2.4.2 - O COVARDE: Outro arquétipo que a gente vê por aí. Na linguagem comum é o arregão, o que não consegue se defender sozinho dos confrontos, sejam físicos ou verbais. O que se submete fácil à pressão dos outros, mas para variar, o arquétipo que quando o Valentão Exibicionista aflora nele, leva uma arma para a escola e mata todo mundo.



UFA, CONSEGUIMOS!

E então, o que acharam desse compilado de arquétipos e suas sombras? Deu trabalho, mas espero que tenha ajudado!

No próximo e último post, trarei os arquétipos masculinos maduros, esses aqui foram os do menino, os próximos serão os do homem. Sim, minha gente, tem muito mais!

Até!


REFERÊNCIAS

MOORE, Robert; GILLETTE, David. Rei, guerreiro, mago, amante: a redescoberta dos arquétipos do masculino. Editora Campus, 1993.

2 comentários:

  1. Meu deus! Tô realizada!
    Não acredito que achei um blog assim. Vai me ajudar muito quando criar minhas histórias ou ajudar outros autores com as deles. Obrigada!

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