Escrever: dom ou dedicação?

domingo, 29 de novembro de 2020

 

Por: Michele Bran

Olá, pessoal. Como estão? Espero que bem e escrevendo bastante.

Hoje trago mais um post que levei originalmente para o meu blog, mas é uma discussão interessante que eu acredito que deva chegar a mais pessoas.

E vamos de debate (hehe).

Há algum tempo (não lembro quanto, minha noção de tempo está meio bugada com essa quarentena), surgiu no grupo do Nyah no Facebook uma discussão sobre se escrever seria um dom ou fruto de muito trabalho.

Como eu não posso ver um tema passível de discussão que já quero brotar e deixar minha opinião, óbvio que fui lá deixar meus dois centavos de ideias sobre a questão e depois expandi para uma postagem inteira a respeito.

O debate não é novo e podemos resumi-lo na existência daqueles que acreditam que escrever é um dom, um talento nato, e outros dizendo que é tão somente resultado da persistência e de muitas horas de prática de estudo. Para um lado, há aqueles que nascem com a capacidade natural de escrever e de quem as palavras parecem fluir como um rio. E para o outro, com muita força de vontade qualquer um seria capaz de escrever qualquer coisa.

Como também já era de se esperar, no meio do caminho, há ~euzinha~; que acredito que nenhum dos dois lados da discussão carrega a verdade verdadeira sobre a questão. Para mim, a escrita de qualidade e fluida é resultado da dedicação com a aptidão.

Explico: é óbvio que estudando, pesquisando, praticando e sempre buscando melhorar, qualquer pessoa pode se tornar um escritor competente. Sobretudo se estamos falando de questões técnicas.

Porém só isso não parece explicar aquelas pessoas que possuem mais facilidade para se expressar do que as outras. Isso fica mais evidente quando observamos gêneros literários. Alguns escritores são divinos escrevendo ficção científica, outros não conseguem escrever nada bom nesse estilo mesmo que gostem dele e consumam muito material a respeito.

Romance, suspense, terror, comédia, ficção histórica, fantasia... Cada um tem mais facilidade com um estilo do que com outro. Eu mesma não consigo gostar de minhas histórias centradas em romance e meus contos de terror são uma derrota. Acho que me saio melhor na fantasia urbana e no suspense. Você que me lê ao do outro lado pode ser o exato oposto. Não é apenas estudo que responde por que isso acontece.

Alguns de nós possuem, também, mais facilidade em escrever na terceira pessoa em ponto de vista profundo. Outros não trocam a primeira pessoa por nada. Há quem ame escrever sob o ponto de vista de múltiplos personagens e quem ache isso um pesadelo completo. Alguns querem ser o novo George Martin. Outros, dariam um braço para ser metade da escritora que foi a Jane Austen. Também não é mera dedicação que nos explica o motivo disso.

Por razões que me são misteriosas por completo, alguns escritores parecem já vir programados de fábrica para escrever de certas maneiras, enquanto muitos de nós nem penando muito consegue fazer algo bom. É a mesma dúvida de porque alguns nascem sabendo cantar, com vozes divinas, e outros odeiam até se ouvir falando (eu mesma, não sei como vocês me aguentam no meu podcast hahaha). Ou porque alguns de nós ama jogar futebol, enquanto outros correm disso como um vampiro das antigas correria de alho.

Claro que estudando muito a gente consegue escrever uma boa cena de beijo mesmo quando romance não é a nossa praia, mas não é nada comparado a quem ama o estilo e tem mais facilidade com ele. A fluidez, a qualidade da cena, a chance de cativar o leitor logo de cara é bem maior nesse segundo caso.

MAS ESPERE!

Não estou escrevendo nada disso para desmotivar você. Sei que parece que estou dizendo que ainda que você estude muito e pesquise, jamais será capaz de escrever bem determinado estilo ou algo do tipo; mas a ideia aqui é outra.

Volte comigo a seus anos de escola. Tenho quase certeza de que, assim como eu, você não era muito bom em exatas, e que, assim como eu também, você se sentia a estupidez com pernas por não entender como os números funcionavam e interagiam (sobretudo, quando metiam letras no meio do negócio). Deve ser a mesma sensação de querermos escrever uma boa história de drama quando não sabemos muito bem como fazer isso.

E do mesmo jeito que não saber matemática não faz ninguém burro porque a aptidão daquela pessoa pode ser, por exemplo, português; não saber escrever determinado gênero ou não ter muita familiaridade com ele não te faz um escritor incompetente.

Você só precisa parar de bater a cabeça na parede e descobrir sua aptidão.

De repente, você não consegue escrever fantasia clássica capa-e-espada porque seu estilo fluiria melhor se você estivesse tentando contar um romance histórico. Ou sua história contada em terceira pessoa parece sem sal porque você é melhor em escrever em primeira pessoa. Talvez até escrever com um personagem só deixe a impressão de estar te limitando porque tudo caminharia melhor para você com múltiplos pontos de vista.

A boa notícia é que cada um de nós tem seu cantinho no mundo da escrita. A ruim é que você vai ter que sair viajando por ele até descobrir se seu lugar é em uma vila medieval, uma floresta cheia de fadas e elfos, uma cidade cinzenta e chuvosa dominada pela criminalidade ou um complexo futurista coberto de neon de alguma megacorporação qualquer.

Aqui vai minha dica final: se teste sempre, experimente largar textos que pareçam sem graça e sem emoção para explorar novas formas de contar histórias. Descobrir qual sua forma de escrever, como você se expressa melhor e do que você realmente gosta vai fazer uma sensação muito gostosa se apoderar de você; que é a de finalmente adquirir autoconhecimento nesse mundinho literário e escrever as histórias que você ainda não viu em nenhuma estante.

Estude, pratique e pesquise SEMPRE, claro, mas tudo isso será tempo perdido se você não souber para que estilo e para qual história você está fazendo isso.

Vai por mim: vai te fazer um bem enorme.

Por hoje é só, pessoal. Beijos, espero que tenham gostado e nos vemos novamente em uma próxima oportunidade :*

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