5 hábitos que vão te ajudar a ser um escritor melhor

domingo, 12 de julho de 2020

            


Por: Edgar Varenberg

    O mundo da escrita, embora encantador, possui um sistema de aprendizado infinito. Isso significa que não importa se você começou ontem ou se você está no ramo há mais de uma década, sempre há algo novo a aprender, sempre descobrimos maneiras novas de expressar situações, de analisar uso de determinados recursos e de se construir literatura como um todo; além disso, a literatura é bastante social e sofre metamorfoses conforme as transformações da própria sociedade. Com isso em mente, o post de hoje traz uma análise de cinco padrões reproduzidos pelos escritores ultimamente, a fim de refletir sobre como esses comportamentos podem atrapalhar o processo de evolução na escrita.

 

1 - Entender como funciona o fenômeno da sinonímia

            É muito comum lermos em dicas para escritores o famoso “evite repetições, use sinônimos”. Mas o que exatamente são os sinônimos? Isso tudo vem do evento gramatical que chamamos de “sinonímia”, que consiste na relação que algumas palavras têm em relação ao mesmo significado. E qual é exatamente a questão em cima disso? É que a relação de sinonímia não é perfeita, as palavras não são capazes de substituir completamente as outras, pois cada palavra é única, ainda que possam carregar valor semântico muito próximo. Vamos analisar isso na prática?

            Vamos trabalhar com o adjetivo inteligente. E vamos pegar outros três adjetivos que possuem valor semântico semelhante: astuto, sábio e esperto. Todas essas palavras remetem a alguém que sabe usar a cabeça, que pensa rápido, que possui conhecimento. Agora vamos destrinchar essas palavras para vermos quais são os contextos que elas aparecem e as sensações causadas ao leitor:

       Inteligente — Geralmente usado em ambientes acadêmicos, facilmente associado a alguém que tem muito conhecimento sobre alto teórico ou alguém que sabe de muitas coisas (seja da mesma área ou de áreas distintas). É usado como elogio em situações nas quais a pessoa que elogiou se sentiu surpreendida.

       Astuto — Geralmente usado em situações mais espirituais ou de façanhas bem mais subjetivas que conhecimento acadêmico, por exemplo. É usado para se referir a pessoas que são discretamente conhecedoras de algo.

       Sábio — Esse termo carrega uma convenção social daquele que tem muita experiência, portanto, geralmente associado a pessoas mais velhas. Refere-se a uma relação proporcional entre conhecimento e tempo.

       Esperto — É basicamente uma relação mais marginalizada do conhecimento. Refere-se àquela pessoa que utiliza sua experiência para se dar bem nas situações, mesmo que isso implique em enganar outra pessoa ou omitir partes da situação geral.

            Ficou perceptível que palavras de significado aparentemente aproximado possuem muitas diretrizes de interpretação e contextualização. Na poesia, por exemplo, existe uma guerra para se encontrar a palavra perfeita, aquela que cabe tanto na estrutura quanto na expressão. É claro que na prosa não precisamos ser tão rígidos com a escolha das palavras, porém entender a sinonímia é fundamental para não fazermos com que certos atributos descaracterizem um personagem ou um ritmo de narração.

            É difícil praticar a percepção de sinonímia? Felizmente não é. Escritores que já estão há certo tempo no ramo com certeza estarão lendo isso com mais facilidade do que aqueles que começaram recentemente, pois a leitura constante faz com que percebamos certos padrões no uso das palavras. Para praticar, é necessário bastante leitura e análise: ver como cada palavra é usada, em que contexto, onde mais aparece. E a melhor parte, é que vale para a linguagem oral também! Perceba a forma como as pessoas falam certas coisas, a entonação, por que ela usa uma palavra em vez de outra, com que intenção. Com a prática, a sinonímia vai ser completamente natural para você.

            O que um mau uso de sinonímia pode refletir na escrita? Isso pode levar a dois caminhos bem complicados. O primeiro deles é uma quebra de refino de caracterização, ou seja, um personagem ou tipo de narração não serem bem representados mediante à escolha vocabular (vimos lá em cima os diferentes contextos de inteligência e o quão importante é escolhermos o mais adequado de acordo com a vivência do nosso texto). Já o segundo caminho é beirar para uma escrita pomposa demais; sei que é incrível a gente pegar um dicionário de sinônimos e ver o quanto nossa língua é rica e tem várias maneiras de dizer as coisas, mas um texto que usa sinônimos demais (uns até formais demais para o registro do texto) tende a ficar pomposo e desconexo: por isso, não se acanhe em repetir uma palavra ou outra, existe uma quantidade tolerável para isso.

 

2 - Confiar na capacidade interpretativa do leitor

Às vezes algum texto nosso pode envolver coisas que vão além do que é popularmente comum, e podemos pensar que o público não vai entender e que precisamos explicar o que está acontecendo. Mas será mesmo? Um dos conceitos que a teoria da literatura coloca para gente como iniciadores de uma leitura é chamado de estranhamento. O que isso significa? É o fenômeno presente na leitura que cria um efeito de uma percepção diferente da arte, através daquilo que lhe causa estranheza, ou seja, mediante tais dificuldades, o leitor vai achar uma nova perspectiva para entender aquele conceito.

            Isso significa que se o texto estiver bem coeso e formulado, o autor não precisa criar notas de rodapé para explicar as coisas, o leitor fará isso por conta própria e cabe ao escritor acreditar nisso. Inserir notas e explicações é uma forma de subestimar a capacidade interpretativa do leitor e isso é completamente contraproducente e antiprofissional, pois faz parecer que nem aquele quem escreveu confia na coerência do próprio material. Portanto, o foco na coesão é o mais importante: leve o seu texto a um amigo ou a alguém que te acompanha como revisor, pergunte se a impressão desejada está sendo transmitida corretamente, assim você terá segurança em publicar sem explicações.

 

3 - Conhecer o trabalho de outros escritores

            Vivemos uma época em que a literatura contemporânea existe e cresce a todo fervor; os best-sellers nos rodeiam, as fanfics iniciam as pessoas no mundo da escrita, e a produção contemporânea existe em revistas e coletâneas mundo afora. Se você está vivo e produzindo literatura neste exato momento, significa que você também faz parte da época contemporânea, portanto, tem as noções sociais de como esse tipo de literatura se constrói. Entretanto, há um enorme problema quando você é escritor, porém não é leitor.

            É de extrema importância que conheçamos o que nossos colegas de época estão produzindo, pois:

      Pessoas diferentes possuem diferentes vivências, logo, o mesmo tema pode ter perspectivas bem opostas, tornando-se crucial para a criação de uma diversidade ao longo de um mesmo assunto;

    Lembra ali que falamos sobre sinonímia e como perceber padrões de leitura? Só conseguimos nos sentir afetados pela literatura enquanto leitores, nossa leitura sob nosso próprio material é comprometida porque somos o processo criativo daquilo. Sendo assim, somente lendo outros autores que podemos perceber que tipos de recursos afetam o texto;

    A literatura é renovável, ela precisa manter um ciclo sustentável, isto é, se estiver mais gente escrevendo do que lendo, ela não vai para frente;

    Ler por si só já é uma atividade extremamente saudável, melhora o discurso, o vocabulário, a sensibilidade artística, entre outras coisas.

            Um escritor, acima de tudo, precisa ser um leitor. Inclusive, ele precisa ler muito mais do que escreve, porque a literatura é uma atividade muito prática e social; não tem como entendermos a sociedade — e querer aplicá-la literariamente — sem entendermos como outros escritores estão enxergando essa sociedade. Torne a leitura um hábito mais frequente e sinta sua percepção de escrita evoluir, pois o conhecimento da diversidade é uma ferramenta poderosa.

 

4 - Visualizar a literatura como um processo criativo complexo

            Este tópico em específico é muito delicado, uma vez que carrega uma subjetividade incômoda. No entanto, ocorre muito em escritores, principalmente iniciantes e intermediários, de tratar a literatura como um processo mais aleatório e menos concreto. Como assim? O processo criativo da escrita tem muita teoria e metodologia, ainda que nem percebamos isso diretamente, existem jeitos de se pensar o fazer literário. Há tempo para tudo: se você planeja escrever um romance, existe o tempo do planejamento, da escrita, do refino, da revisão, da reescrita, da experimentação, etc. Escrever é um processo complexo, demorado e difícil.

            Se você tem em mente escrever um livro inteiro, não pense que isso é feito em dois ou três meses, mesmo que você consiga escrever todo o conteúdo em um mês apenas. A literatura não é escrever só por escrever, mas exige usar a comunicação ao seu favor; não é só contar uma história, é dar vida a uma história, e é por isso que existem recursos e técnicas de escrita que exploram essa necessidade. E, mesmo assim, nem tudo é composto por técnicas e recursos, às vezes o fazer literário reside na identidade do autor, o quanto ele expressa sua vivência naquele enredo, o quanto ele expõe a mensagem necessária. O livro, a história, é uma ligação de fatos, é você juntar acontecimentos para levar uma mensagem, trazer uma sensação. E, para isso, há o refino da escrita, que é trabalhoso.

            O fazer literário é como se envolver num relacionamento sério. É uma coisa que você começa e precisa ir nutrindo, cuidando, polindo, assim como também precisa vivê-lo, passar os dias, ter uma opinião num dia e ter outra semanas depois (e ver como isso interfere na sua obra), é a transformação do próprio fazer humano. Futuramente farei um post para vocês inteiramente sobre essa questão do refino!


5 - Ser mais tolerável a críticas

            Este tópico em específico é o mais trabalhoso de se lidar e, não à toa, deixei por último. Todo o processo de escrita é muito envolvente e acolhedor, nos sentimos produtivos, criamos universos novos, mensagens inspiradoras e toda a nossa obra parece ser um pedaço da gente, certo? Sim e não. Embora seja maravilhoso experimentar essas sensações, o apego ao próprio material mais traz obstáculos do que vantagens para o escritor. Se tornar resistente a opiniões contrárias, por exemplos, não querer que o texto passe por reformulações (que visam a melhora do próprio texto), são coisas que podem colocar todo o seu processo criativo em risco. Escritores precisam ser abertos às críticas, não tem outro jeito, principalmente se ele leva o seu trabalho a um revisor. O revisor está ali e ele sabe o que está fazendo, um bom revisor nunca vai querer remover sua essência ou conspirar contra a sua história.

            Parece às vezes que as críticas são mal-intencionadas ou que foram feitas para ferir nossos lados pessoais, mas é importante entender como se compõe a essência da crítica. Esse tipo de trabalho requer uma sensibilidade enorme, uma grande capacidade de questionamento e argumentação; você verá que um bom revisor/crítico sempre vai saber argumentar o motivo pelo qual ele apontou alguma coisa. E você tem todo o direito de achar o apontamento inválido! Jamais levar para o lado pessoal, ou pior, sentir desmotivação por ver que muitas coisas foram apontadas. Pelo contrário, a oportunidade de ter alguém te acompanhando com todo esse cuidado deve ser muito bem aproveitada (não se acanhe e faça muitas perguntas)!

            Como já dito, a aprendizagem no ambiente literário é infinita, mas a meta é diminuir o máximo possível a dúvida e tornar os acertos cada vez mais naturais. Se identificou com algum dos itens? Tem algo para refletir? Comenta aí pra gente!


Um comentário:

O blog da Liga é um espaço para ajudar os escritores iniciantes a colocarem suas ideias no papel da melhor maneira possível.



As imagens que servem de ilustração para o posts do blog foram encontradas mediante pesquisa no google.com e não visamos nenhum fim comercial com suas respectivas veiculações. Ainda assim, se estamos usando indevidamente uma imagem sua, envie-nos um e-mail que a retiraremos no mesmo instante. Feito com ♥ Lariz Santana