Por: Izabel Hiddlesworth
Link no Nyah: https://fanfiction.com.br/u/ 279239/
APRESENTAÇÃO
Olá, queridos leitores, tudo bem? Eu sou a Izabel Hiddlesworth e dessa
vez vim aqui no Blog atender a um pedido de vocês. Vou passar dicas de como
escrever cenas de guerra, com foco em táticas, yay!
Acredito que cenas de conflito estão no top 3 de “terror dos autores”.
Por isso, essas dicas vão ser mais generalizadas. Assim vocês poderão aplicar
para qualquer época/configuração de mundo/tipo de armas. Mas eu ainda vou
soltar algumas mais específicas, ok?
De modo geral, nós vamos passar pelo planejamento e desenvolvimento de
ataque/defesa, a divisão de frentes e o movimento delas e a interação com o
inimigo. Construção de motivos de guerra, trabalho de sentimentos, relações de
personagens e etc não vão aparecer aqui, mas vocês podem buscar por essas dicas
em outros artigos do nosso Blog.
Ao longo dos séculos, as estratégias e táticas militares foram se
aprimorando, o que levou a muitas oscilações de princípios de guerra de um
líder militar para outro. Nesse artigo, eu tomei como base os princípios mais
gerais utilizados atualmente. Eles vão permear os nossos dias, e lá no final,
na seção de materiais de apoio, vou deixar links com a listagem na íntegra,
certo?
Importante lembrar que aqui vamos focar em táticas (escala micro), não em
estratégias (escala macro). O que não quer dizer que a tática pode trabalhar
completamente isolada da estratégia, hein. A estratégia cria a base para o
trabalho tático.
O artigo está dividido em três seções maiores que também não pode
trabalhar isoladas uma da outra. Você vai perceber que todas estão intimamente
conectadas, e que as dicas pedem que você as alinhave para criar uma tática
completa.
Ok, tudo pronto? Vamos lá!
DOS SOLDADOS
O equipamento pessoal
Essa é uma das partes que varia muito dependendo da época/mundo em que
sua guerra se passa. O equipamento pessoal abrange desde as vestimentas até as
armas e acessórios. Esse quite muda de acordo com a posição do soldado dentro
das divisões da força e o território em que ele vai ser inserido. Essa é a
condição ideal, mas pode ser que as coisas não saiam como o planejado, o que
vai gerar desvantagens para o soldado.
Imagine, por exemplo, um cavaleiro com armadura e cota de malha lutando a
pé em um terreno lamacento sob chuva. Ou um soldado com vestimentas leves na
infantaria recebendo uma saraivada de balas. Morte certa, não é? Um exército tem
um quite de equipamento padrão, que sofre poucas variações de um setor para
outro; é difícil estar total e completamente preparado para qualquer tipo de
artilharia inimiga e condições de terreno.
Ok, e as armas? Assim como os uniformes, cada exército tem um leque de
artilharia disponível de acordo com o poderio tecnológico da nação que ele
defende. É muito bacana usar os nomes das armas (se o seu mundo for original,
invente nomes para elas!), porque deixa a descrição mais palpável e menos
repetitiva. As armas também variam de acordo com a posição e patente, e geram
vantagens/desvantagens. Nessa parte, é preciso levar em conta tamanho, peso e
alcance (curto, médio e longo).
Para as cenas é importante: apresentar
o quite de equipamento para o leitor e expor vantagens e desvantagens em
relação ao equipamento inimigo e às condições do campo de batalha.
As divisões
A configuração das divisões muda de época para época. Nos primórdios, os
exércitos eram compostos por fazendeiros despreparados, juntos numa massa só.
Nas guerras mundiais, temos exércitos enormes estruturados em unidades grandes
e articuladas o bastante para desempenhar operações separada e
concomitantemente (daí, várias frentes de guerra).
E como as unidades são formadas? Escolhe-se uma artilharia principal (um
conjunto de uma mesma arma) e então as divisões que darão apoio a esse tipo de
artilharia. Basicamente, uma unidade trabalha sobre o planejamento de um ataque
combinado. Até aqui tudo bem?
Partimos para as divisões. Aqui temos, na ordem de posição e de modo
geral:
1.
Infantaria: “paredão” de linha de frente, é o primeiro
choque com o inimigo.
2.
Cavalaria: soldados “montados”. Nos exércitos antigos,
o tamanho da cavalaria evidenciava o poder econômico daquele exército.
3.
Blindada: soldados em carros de campanha/tanques.
4.
Artilharia: atiradores, equipados para dizimar o
exército inimigo.
Em 1, o objetivo é, dependendo se o exército está em modo de ataque ou
defesa, abrir terreno, ou impedir o avanço inimigo. Assim, 2 fica como reforço
da 1.ª ou na 2.ª linha de frente, ou então na retaguarda. A tarefa da cavalaria
é abrir brechas nas linhas inimigas, quebrando sua organização. Importante
ressaltar aqui que “cavalaria” não necessariamente se refere a cavalos ou
outros tipos de montaria. Pode se referir ao uso de aviões e a veículos
blindados, o que nos leva ao item 3.
Em 3, o objetivo é basicamente o mesmo de 2. Essa divisão pode,
inclusive, excluir a 2 e/ou a 1. Ela também pode ter uma unidade “mecanizada”
de apoio (terrestre ou não).
E finalmente chegamos no item 4. A artilharia é tão importante que pode
constituir uma unidade inteira sozinha. Aqui são colocadas as armas mais
potentes com o objetivo de concentrar o poder de fogo. O general no comando é
como um maestro, ele coordena o momento e o tempo que cada linha de artilharia
vai operar.
Na estratégia que você vai bolar para a história, suas unidades não
precisam ser todas iguais nem ter todos esses itens. As táticas talvez variem
de unidade para unidade, e pode ser que, dependendo das configurações que você
adotar, haja necessidade de movimentos combinados entre duas ou mais unidades.
E aqui puxo uma observação para o item anterior: o equipamento do soldado de
uma divisão é diferente em relação ao colega de outra, mesmo que eles sirvam a
um mesmo exército.
Para as cenas é importante: permitir
que o leitor visualize a formação que você escolheu para as unidades, e como o
ataque/a defesa (a tática, por assim dizer) é coordenado a partir das divisões
que ela possui; a justificativa para o equipamento está aqui.
DO PLANEJAMENTO
O estopim
Como tudo, a guerra também começa com um planejamento, que, claro, está
suscetível a mudanças (e mudanças bruscas!). Esse “prólogo” deve contar com
itens como frentes de ataque/defesa, divisão de forças, estudo do terreno de
campanha, levantamento de possíveis falhas e estimativa de resultados. Na
guerra, menos é mais, por isso, um dos princípios é manter a simplicidade,
tendo em mente a alta moral e os objetivos mais importantes.
O primeiro conflito é uma das partes mais cruciais, vamos dizer assim.
Ele vai redirecionar o planejamento dos próximos passos e, provavelmente,
redefinir a urgência dos objetivos. Aqui, tem-se duas opções: 1) proporção de 1
para 1; 2) proporção de 3 para 1. Ok, mas o que isso significa? A proporção diz
respeito à quantidade de unidades que vão ser enviadas. Na opção 1, uma unidade
sua combate uma unidade inimiga, e a probabilidade de ganho e perda começa
igual para os dois lados. Já na opção 2, você envia duas ou mais unidades suas
para combater uma unidade inimiga, e a sua probabilidade de perda vai ser
menor. Lembrando sempre que o andar da guerra é imprevisível, e pode ser que
seu inimigo aposte em mais unidades nesse passo inicial.
Pensando no terreno, tem-se três configurações: 1) A (seu lado) ataca e B
defende o território; 2) A defende o território e B ataca; 3) A e B atacam em
território neutro. Na configuração 1, B tem vantagem sobre o território
(espaço), mas A pode deter o fator surpresa (tempo). Na 2, se o seu lado está
defendendo o espaço, supõe-se que há uma vantagem de tempo para o preparo de
armadilhas e o fator de familiaridade com o terreno. Na 3, A ou B precisam
tomar a iniciativa inicial, e não há vantagens territoriais para nenhum dos
dois.
Naturalmente, A e B terão conhecimentos de informações prévias (falsas ou
verdadeiras) sobre a estratégia de um e de outro. Então, dependendo de como a
estratégia está funcionando (quantas frentes de batalha estão abertas ao mesmo
tempo), os lados podem empregar ataque/defesa aéreo, marítimo, terrestre
(várias unidades de configurações diferentes) e pensar no tipo de artilharia
explorando os pontos fortes e fracos do inimigo.
Você deve levar em consideração que é apenas o começo da guerra. Embora
ganhar ou manter vantagens seja importante, poupar seus recursos (soldados e
artilharia, principalmente) é mais. Afinal, ninguém sabe como a guerra vai
terminar, não é? (Tudo bem, você sabe porque é o autor). Então, o primeiro
conflito deve trabalhar com o básico: não se expor demais, não gastar demais,
ser prático e direto.
Para as cenas é importante: apresentar
o saldo do conflito ao leitor e dar pistas (ou esclarecer) do que isso
representa e influência no planejamento. O leitor deve ser levado a entender
essa justificativa satisfaz as escolhas tomadas para os próximos passos.
Os próximos passos
Depois do primeiro encontro, o planejamento se torna um tanto mais
complexo. É preciso avaliar os resultados antes de mexer nos cálculos iniciais.
A ganha ou perda de terreno influenciará muito aqui, bem como o conhecimento do
modo de operação inimigo em batalha. Por isso, de novo, é importante ter planos
simples e flexíveis, poupando o máximo de recursos possível.
As táticas podem sofrer alterações, por exemplo, na montagem das
unidades, ou na combinação de duas ou mais unidades. Você sempre vai depender
das ações inimigas, do terreno, das condições meteorológicas e dos recursos
ainda disponíveis.
Depois de cada conflito, o ciclo
é: calcular resultados e recalcular o planejamento dos próximos.
Para as cenas é importante: justificar
as tomadas de decisões. Essas decisões podem ser prejudiciais ou não no futuro,
podem ser muito racionais ou desesperadas, mas precisam ser justificadas.
DO ESPAÇO/TEMPO
O terreno
Nas seções anteriores, nós
passamos brevemente por menções ao terreno de batalha, mas já deu para ter
noção da importância de se ter conhecimento sobre ele, não é? Para começar, o
pensamento de “tudo muda o tempo todo” também precisa ser aplicado aqui. O
terreno muda a cada batalha.
De maneira superficial, ele pode
ser influenciado pelos destroços gerados pelo confronto (destroços causados por
explosões, restos de munição, corpos), pela ação humana (sabe como o gramado
fica depois de um jogo de futebol?) e pelas condições meteorológicas (antes,
durante e depois). Além disso, voltando nas passagens sobre vantagem de espaço,
o terreno pode ser alterado antes mesmo da batalha.
E como isso acontece? Só com armadilhas
para a força inimiga? Não, você tem muitas maneiras de aproveitar essa
vantagem. Suas unidades podem cavar trincheiras, erguer barricadas, arquitetar
casamatas ou abrigos subterrâneos mais simples, e há várias formas de se usar
essas estruturas também, só depende da tática adotada (como as unidades
coordenarão o ataque entre si).
As trincheiras, por exemplo, eram
utilizadas uma passagem (pular dentro para se proteger, sair correndo para
atacar), mas então se tornaram pontos importantes para a artilharia trabalhar
com mais segurança e tempo para mira. As barricadas podem ser construídas com
destroços encontrados no próprio terreno. Os abrigos subterrâneos fornecem
proteção contra o fogo inimigo em turno longo, e podem servir de rota para o
reabastecimento de homens e munições nas linhas de frente; e as casamatas, além
disso, servem como pequenas fortificações.
Para as cenas é importante: descrever
a aparência do terreno (é interessante fazer um paralelo entre a aparência
“original” e a tocada pela guerra). Evidenciar mudanças ao longo do
desenvolvimento da guerra, inclusive em relação a perda/conquista de espaço.
Apontar vantagens e desvantagens para os soldados e seus equipamentos, bem como
para a formação e coordenação das unidades.
A duração da guerra
Para mim, as coisas duram o quanto
tiverem de durar. Mas Julio Cortázar é da opinião de que “Tudo sempre dura um
pouco mais do que deveria” (tudo bem, às vezes eu acho que ele tem razão).
O primeiro conflito vai dar uma
noção (pouco ou muito vaga) sobre o tempo de duração da sua guerra. Mas aqui é
preciso pensar na estratégia, nos recursos disponíveis (por exemplo, o exército
tem munição para quanto tempo?), na resistência que o terreno exige e na sua
manutenção, na dificuldade do alcance dos objetivos principais.
A eficiência da estratégia e das
táticas, as mudanças do entorno diplomático da guerra e do planejamento vão
determinar a duração. Alguns conflitos foram resolvidos em apenas um dia, mas
também temos guerras que duraram anos e anos! É importante observar que essas
guerras mais demoradas tiveram batalhas igualmente demoradas (de durar
semanas!).
Para as cenas é importante: passar
estimativas (mesmo que vagas) da duração da guerra/das batalhas para o leitor.
Evidenciar os lucros e prejuízos provocados pela extensão desse período.
Observar o fator de resistência da tática inicial e das que se seguem.
Os turnos
Uma guerra de verdade claramente
não é como um joguinho daqueles de celular, não é? O que eu quero dizer é: os
turnos não são alternados com “você ataca primeiro e eu espero, depois é minha
vez”. Não tem essa. Como também não tem nada de “Vamos combinar de lutar hora
tal no dia tal”.
De novo, um lado pode ter (e vai
ter mesmo) informações prévias sobre o outro, verdadeiras ou falsa. Não vamos
entrar no mérito de saber como essas informações chegaram, só vamos contar com
elas. Isso pode nortear o dia, horário e local de uma batalha, da abertura de
uma frente de guerra. Mas nem todas vão ser assim.
Os turnos prioritários são os de
ataque, e os de defesa são encaixados entre eles. Note que defesa aqui não é
estar no campo de batalha segurando o inimigo. É o momento de vigiar enquanto
os soldados descansam, os feridos são tratados, os mortos, contados e a tática
reavaliada.
Nessa parte, o princípio da surpresa
e o julgamento correto da hora certa de empreender o ataque são importantes. E
além deles, os objetivos de cada ataque: destruir um grupo de divisões (a
artilharia, por exemplo) das unidades inimigas, destruir seus recursos, exaurir
o inimigo, exterminá-lo. Esse direcionamento rege o horário do turno e a
duração dele, servindo como base para os próximos passos da empreitada e como a
tática vai funcionar.
Para as cenas é importante: comentar
a escala de turnos e justificá-la em termos de horário, organização posicional
e objetivo. Coordenar os turnos de maneira que a tática faça sentido, fazendo
paralelos com outras frentes de guerra.
ENCERRAMENTO
Exemplos
Para encerrar, eu colhi alguns
exemplos para vocês entenderem como todos esses elementos que nós vimos vão
conversar entre eles para criar a tática.
1.º “O Rei”
Esse é um filme da Netflix do ano
passado que retrata eventos históricos da vida de Henrique V da Inglaterra. No
enredo há a batalha de Azincourt, travada entre ingleses e franceses em
território francês. Durante dias, os dois lados esperam pela rendição do outro,
até que decidem que haverá luta. A tática dos ingleses é planejada então de
acordo com as condições meteorológicas (a promessa é chuva para a noite
anterior ao conflito) e de como isso afetará o campo, bem como os empecilhos
que isso trará à força inimiga (fortemente munida de armaduras e montarias).
Enquanto uma divisão do exército de Henrique V enfrenta os franceses a pé e sem
armaduras (para se movimentar com mais facilidade!), outra munida de arcos e
flechas (a artilharia!) ataca na retaguarda.
2.º Segunda Guerra Mundial
Na 2.º GM, os países montavam
estratégias que uniam todas as Forças (Exército, Marinha e Aeronáutica),
coordenando suas ações entre turnos. Uma das táticas alemãs, por exemplo,
consistia em abrir fogo com bombardeios primeiro e então enviar os tanques para
abrir a defesa inimiga. Depois, as divisões seguintes entravam em cena para
ocupar o território.
Conhecendo a guerra
Mesmo que sua história se passe em
um mundo original ou muito diferente do nosso mundo, buscar exemplos em guerras
na história é muito proveitoso. Alimente-se de filmes, documentários, artigos
de historiadores e depoimentos de sobreviventes e pesquise sobre a organização
das forças de cada época.
Bem, é isso soldados! Espero que
esse artigo tenha sido de ajuda e que vocês possam aprender e se divertir muito
escrevendo suas cenas.
Nos vemos por aí!
MATERIAIS DE APOIO
1. https://hypescience.com/10-diarios-que-nos-fazem-ter-uma-ideia-melhor-do-horror-da-segunda-guerra-mundial/. Acesso em 29 de março de 2020.
2. https://super.abril.com.br/historia/a-arte-da-guerra/.
Acesso em 30 de março de 2020.
3. https://incrivelhistoria.com.br/falange-macedonia-alexandre-grande/.
Acesso em 30 de março de 2020.
O texto foi muito útil, pois estou escrevendo cenas de guerra, figurando no meu livro "O Mercador de Escravos Cristãos".
ResponderExcluir