Por: Elyon Somniare
Saudações! Ansiosos para a terceira e última parte do
discurso do “Nelinha”? Suspeito que alguns deverão ter esperado para ter a
tradução toda disponível, de modo a poderem ler tudo de uma assentada. Para
esses, o tempo de esperar terminou =)
Enjoy:
“(…)
Sexto. Vou transmitir algum conhecimento freelancer secreto. Conhecimento
secreto é sempre bom. E é útil a alguém que planeia criar arte para outras
pessoas, que queira entrar no mundo freelancer de qualquer área. Eu aprendi-o
com as comics, mas também se aplica a outros campos. E é isto:
As pessoas são contratadas porque, de
algum modo, são contratadas. No meu caso fiz algo que nos dias de hoje seria
fácil de verificar e que me deixaria em sarilhos, e que quando eu comecei,
nesses dias pré-internet, parecia uma estratégia de carreira sensata: quando
editores me perguntavam para quem eu tinha trabalhado, mentia. Listava um
punhado de revistas que me pareciam prováveis, soava confiante, e conseguia os
trabalhos. Mais tarde tornei questão de honra escrever algo para cada uma das
revistas que listei para conseguir aquele primeiro emprego, para que não
tivesse mentido de verdade, só cronologicamente desafiado… Consegues trabalho
de qualquer maneira que consegues trabalho.
As pessoas continuam a trabalhar, num
mundo freelancer, e cada vez mais e mais do mundo de hoje é freelancer, porque
o seu trabalho é bom, e porque são fáceis de se lidar com, e porque entregam o
trabalho a tempo. E nem sequer precisas de todas estas três coisas. Duas de
três é bom. As pessoas vão tolerar quão desagradável és se o teu trabalho é bom
e o entregas a tempo. Vão perdoar o atraso da entrega se o trabalho é bom e se
gostam de ti. E não tens de ser tão bom como os outros se és pontual e é sempre
um prazer conversar contigo.
Quando concordei com este discurso,
comecei a pensar qual foi o melhor conselho que me deram ao longo dos anos.
E veio do Stephen King, há vinte
anos, aquando o sucesso de Sandman.
Eu estava a escrever uma comic que as pessoas adoravam e estavam a levar a
sério. King tinha gostado de Sandman
e do meu livro com Terry Pratchett, Bons
Augúrios, e viu a loucura, as longas filas de autógrafos, tudo isso, e o
seu conselho foi este:
“Isto
é realmente bom. Devias aproveitar.”
E eu não aproveitei. O melhor
conselho que tive que ignorei. Em vez disso preocupei-me. Preocupei-me sobre a
próxima deadline, a próxima ideia, a próxima história. Não houve um momento nos
catorze ou quinze anos seguintes em que eu não estivesse a escrever alguma
coisa na minha cabeça, ou a questionar-me sobre isso. E não parei e olhei em
volta e pensei, isto é mesmo divertido.
Queria ter aproveitado mais. Tem sido uma viagem fantástica. Mas houve partes
da viagem que perdi, porque estava demasiado preocupado sobre coisas correrem
mal, sobre o que viria a seguir, para aproveitar o momento em que eu estava.
Essa foi a lição mais difícil para
mim, penso: deixar-me ir e aproveitar a viagem, porque a viagem leva-nos a
alguns lugares memoráveis e inexplicáveis.
E aqui, nesta plataforma, hoje, é um
desses lugares. (Estou-me a divertir imenso.)
A todos os graduados de hoje:
desejo-vos sorte. A sorte é útil. Irão descobrir com frequência que quanto mais
arduamente trabalharem, quanto mais sabiamente trabalharem, mais sortudos
serão. Mas a sorte existe e ajuda.
Agora mesmo estamos num mundo em
transição, se estás em qualquer tipo de campo artístico, porque a natureza
distributiva está a mudar, os modelos pelos quais os criadores lançavam o seu
trabalho ao mundo, e conseguiam manter um tecto sobre as cabeças e comprar
sanduíches enquanto o faziam, estão todos a mudar. Tenho falado com pessoas no
topo da cadeia alimentar em edição, venda de livros, em todas essas áreas, e
ninguém sabe como o quadro será daqui a dois anos, quanto mais uma década. Os
canais de distribuição que as pessoas têm construído durante mais ou menos o
último século estão em fluxo para as impressões, para as artes visuais, para os
músicos, para as pessoas criativas de todos os tipos.
O que é, por um lado, intimidador, e,
por outro, extremamente libertador. As regras, as suposições, os “agora é
suposto que nós” que vêem o teu trabalho e o que fazes a seguir, estão a
quebrar-se. Os porteiros estão a deixar os seus portões. Podes ser tão criativo
quanto precisas de ser para ter o teu trabalho visto. O Youtube e a Web (e o
que quer que seja que venha depois do Youtube e da Web) podem dar-te mais
pessoas a verem o teu trabalho do que a televisão alguma vez pôde. As velhas
regras estão a desintegrar-se e ninguém sabe quais são as novas regras.
Então inventa as tuas próprias
regras.
Recentemente alguém perguntou-me como
fazer algo que ela achou que seria difícil, neste caso, gravar um audiobook, e
sugeri que ela fingisse ser alguém que o conseguisse fazer. Não fingir que o
fazia, mas fingir que era alguém que o conseguia fazer. Para esse efeito ela
colocou um recado na parede do estúdio, e disse que ajudou.
Então sê sábio, porque o mundo
precisa de mais sabedoria, e se não consegues ser sábio, finge que és alguém
que é sábio, e então limita-te a comportar-te como alguém sábio se comportaria.
E agora vai, e comete erros
interessantes, comente erros maravilhosos, comete erros gloriosos e
fantásticos. Quebra regras. Torna o mundo mais interessante por estares aqui.
Faz boa arte.”
Neil Gaiman
Não
irei escrever muito mais por aqui, visto que a Nelinha já falou imenso, mas não
podemos negar que são palavras que valem a pena ler. Estou apenas a ranger os
dentes perante a grande quantidade de “and/e”, ahah.
Discurso e transcrição
originais disponíveis aqui: http://www.uarts.edu/neil-gaiman-keynote-address-2012
Eu não poderia ter encontrado esse discurso em um melhor momento para mim! De verdade, muito obrigada por disponibilizá-lo. <3
ResponderExcluirAinda bem que te ajudou! Obrigada pela leitura :D
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