Por Deathless Nokas
Queres enriquecer a tua escrita, aprendendo a usar os verbos a teu favor e aprendendo a envolver mais o leitor nas tuas palavras?
Então não podes perder este artigo de Chuck Palahniuk, o autor de “Clube da Luta” e de inúmeros artigos sobre escrita muito aclamados. Aqui ele ensinar-te-á a deixar de usar verbos como “pensar”, “saber”, “compreender”, “entender” e “considerar”, por acreditar que eles te impedem de passar a mensagem que queres com a intensidade que desejas. Ah, e “acreditar” também é outro desses verbos...
A tradução foi feita por mim e, no final, ficará o link onde poderás encontrar o original e uma tabela que também compus, com alguns dos “verbos de pensamentos” que o autor recomenda que deixes de usar.
“Daqui a seis segundos, vais odiar-me.
Mas daqui a seis meses serás um melhor escritor.”
De agora em diante ― pelo menos por meio ano ― tu não poderás usar verbos “de pensamentos”. Estes incluem: Pensar, Saber, Compreender, Perceber, Acreditar, Querer, Recordar, Desejar e centenas de outros que tu adoras usar.
Esta lista também deve incluir Amar e Odiar.
E deve incluir Ser e Ter, mas vamos falar desses mais tarde.
Até passarem esses seis meses, não poderás escrever “Kenny pensou se Monica não gostava que ele saísse de noite...”
Em vez de isso, terás de desmembrar a ideia: “Nas manhãs seguintes às noites em que Kenny ficava na rua até depois do último autocarro/ônibus passar, até ele ter de cobrar uma boleia/carona ou pagar por uma viagem de táxi para casa onde encontrava Monica a fingir que dormia, a fingir porque, ela nunca dormia assim tão silenciosamente, nessa manhãs, ela punha apenas a sua chávena de café no microondas. Nunca a dele.”
Em vez de teres os personagens a saber alguma coisa, tu agora terás de apresentar os detalhes que permitirão ao teu leitor ficar a saber essa coisa. Em vez de teres uma personagem a querer alguma coisa, agora terás de descrever essa coisa para que seja o teu leitor a querê-la.
Ao invés de dizeres “Adam sabia que Gwen gostava dele”, terás de dizer:
“No intervalo entre as aulas, Gwen encostava-se sempre ao seu cacifo/armário quando ele o tinha de abrir. Ela reviraria os olhos e ir-se-ia embora ganhando impulso com um pé, deixando uma marca negra no metal pintado com o seu calcanhar, mas deixando também o seu perfume para trás. A fechadura ainda estaria quente pelo toque do seu traseiro. E no intervalo seguinte, Gwen estaria lá novamente.”
Resumindo, nada de resumires as coisas. Deixa ficar apenas os detalhes específicos absorvidos pelos sentidos: ações vistas e cheiros, sabores, sons e texturas.
Normalmente, os escritores usam estes verbos “de pensamento” no início de um parágrafo (desta forma, podemos chamar-lhes “Frases de Teses” e manifestar-me-ei contra elas mais tarde). De certa maneira, a frase de tese expõe a intenção do parágrafo. O que se segue, serve para a ilustrar.
Por exemplo:
“Brenda sabia que não conseguiria cumprir com o prazo. O tráfego acumulava-se desde a ponte, até depois das seguintes oito ou nove saídas da estrada. A bateria do seu telemóvel/celular tinha morrido. Em casa, os cães precisariam de um passeio, ou haveria uma sujeira para limpar depois. Para além disso, ela tinha prometido que regaria as plantas do vizinho...”
Vês como o começo com uma “frase de tese” roubou a importância ao que se seguiu? Não faças isto.
Senão tiveres mais nenhuma alternativa, corta a frase do início e coloca-a depois de todas as outras. Ou, melhor ainda, move-a e muda-a para “Brenda jamais cumpriria com o prazo.”
Pensar é algo abstrato. Saber e acreditar são coisas intangíveis e intocáveis. A tua história será sempre mais forte se tu apenas mostrares as ações físicas e os detalhes das tuas personagens e permitires ao teu leitor que seja ele a pensar e a saber. E a amar e a odiar.
Não digas ao teu leitor “Lisa odiava Tom”.
Em vez disso, constrói o teu caso como um advogado num tribunal, detalhe a detalhe. Apresenta cada pedacinho das provas. Por exemplo:
“Durante a chamada na aula, no instante a seguir ao professor dizer o nome de Tom, no momento anterior à sua resposta, nessa altura, Lisa iria sussurrar-gritar ‘Otário’, mesmo antes de Tom dizer ‘Estou aqui’."
Um dos erros mais comuns que os escritores iniciantes fazem é deixar as suas personagens sozinhas. Ao escrever, podes estar sozinho. Ao ler, os teus leitores podem estar sozinhos. Mas as tuas personagens devem passar muito, muito pouco tempo sozinhas. Porque uma personagem solitária começa a pensar, a preocupar-se ou a considerar.
Por exemplo: “Enquanto esperava pelo autocarro/ônibus, Mark começou a preocupar-se com o quanto a viagem iria demorar.”
Um bom desmembramento dessa ideia poderia ser: “O horário dizia que o autocarro/ônibus chegaria ao meio-dia, mas o relógio de Mark dizia que já eram onze e cinquenta e sete. Podia ver-se a estrada toda até ao centro comercial, e não se via nenhum autocarro. Sem dúvida que o condutor estaria parado numa rua ali ao lado, a dormir uma sesta. O condutor estaria recostado, adormecido, e Mark chegaria atrasado. Ou pior, o condutor estaria a beber, pararia ali bêbado e cobraria a Mark o bilhete para a sua morte num grandioso acidente...”
Uma personagem sozinha deve submergir em fantasias ou memórias, mas mesmo assim não poderás usar verbos “de pensamento” ou nenhum dos seus parentes abstratos.
Oh, e podes começar a esquecer o uso dos verbos esquecer e lembrar.
Não haverá mais passagens como “Wanda lembrou-se de como Nelson costumava escovar-lhe o cabelo.”
Em vez disso: “Na altura do segundo ano de universidade deles, Nelson costumava escovar o cabelo dela com longos e suaves movimentos da sua mão.”
Novamente: desmembra. Não aceites atalhos.
Melhor ainda, junta a tua personagem a outra personagem, depressa. Coloca-os juntos e faz com que se inicie a ação. Deixa que as suas ações e palavras mostrem os seus pensamentos. Tu ― fica fora das suas cabeças!
E enquanto andas a evitar os verbos “de pensamento”, toma cuidado ao usar os verbos sem sal “ser” e “ter”.
Por exemplo:
“Os olhos de Ann são azuis.”
“Ann tem olhos azuis.”
Ao invés, usa:
“Ann tossiu e passou uma mão sobre a face, limpando o fumo de cigarro dos olhos, olhos azuis, antes de sorrir...”
Em vez das desinteressantes frases com “é” e “tem”, tenta enterrar os detalhes de o que as personagens têm ou são em ações ou gestos. Na sua forma mais básica, isto será mostrar a tua história, em vez de a contares.
E para todo o sempre, depois de também teres aprendido a desmembrar as tuas personagens, tu odiarás o escritor preguiçoso que se deixar ficar por “Jim sentou-se ao lado do telefone, pensando sobre o porquê de Amanda ainda não ter ligado.”
Por favor. Por agora, odeia-me o quanto tu quiseres, mas não uses verbos “de pensamento”. Daqui a seis meses, podes até endoidecer de tanto os usares, mas aposto o meu dinheiro em como não vais querer fazer isso.
Os teus trabalhos de casa serão passares os olhos pelos teus textos e circular todos os verbos “de pensamento”. Depois, encontra alguma forma de os eliminares. Aniquila-os desmembrando-os.
A seguir podes passar os teus olhos por livros publicados e fazer o mesmo. Sê implacável.
“Marty imaginou peixes saltando à luz da lua...”
“Nancy recordou a forma como o vinho sabia...”
“Larry sabia que era um homem morto...”
Encontra-os. Depois disso, encontra uma forma de os reescreveres. Torna-os mais fortes.”
Achar
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Conceber
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Desejar
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Interpretar
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Perceber
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Relembrar
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Acreditar
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Concentrar-se
em
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Especular
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Lembrar
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Perguntar-se
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Reparar
em
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Adivinhar
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Concluir
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Esquecer
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Memorizar
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Preocupar-se
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Saber
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Aperceber-se
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Concluir
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Fantasiar
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Notar
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Querer
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Sonhar
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Calcular
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Considerar
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Imaginar
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Opinar
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Reconhecer
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Supor
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Compreender
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Deduzir
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Inferir
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Pensar
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Recordar
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Teorizar
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Amar
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Odiar
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Não te esqueças que vários destes verbos podem ter mais do que uma função ou sentido, está bem? Tem em consideração que o CONTEXTO é que determina se um verbo é ou não “de pensar”. Não deves abulir estes verbos da tabela do teu vocabulário ou da tua história. O CONTEXTO é que determina essa necessidade. Se uma personagem disser “Eu penso que deverias cortar o cabelo,” isso não terá de ser desmembrado. Se algum verbo que não estiver nesta lista tiver a função de resumir o que se passa na mente da tua personagem, então também deve ser riscado do texto.
Publicação original por Chuck Palahniuck, “Nuts and Bolts: ‘Thought’ Verbs”, consultado a 22 de Janeiro de 2014. Disponível em: http://litreactor.com/essays/chuck-palahniuk/nuts-and-bolts-%E2%80%9Cthought%E2%80%9D-verbs
Cara, muito bom! Como eu disse no grupo da Liga, não é somente uma postagem, mas também um desafio! Já estamos nos organizando para aceitá-lo e escrever uma fic segundo esses preceitos! Amei demais!
ResponderExcluirEu também amei a postagem *-* Os próximos dias serão passados a betar e a corrigir capítulos xD
ExcluirInteressantes esses conselhos. Vou tentar pô-los em prática nas minhas próximas histórias (provavelmente terei que escrever primeiro no meu jeito tradicional e depois reescrever seguindo essas dicas).
ResponderExcluirBom trabalho!
ExcluirSensacional, o artigo! De verdade, muito bom! Salvei na minha coletanea de textos sobre escritas!
ResponderExcluirParabéns, mesmo!!
Super util..irei me esforçar para seguir essas dicas
ResponderExcluirBom trabalho (:
ExcluirPrefeito.. irei comecar a usar..o começo vai ser dificil..
ResponderExcluirBom trabalho :D
ExcluirMaaaaas, isso é possível? D: HSUIAHSUHSIUA
ResponderExcluirEu sei que é, porém é difícil só imaginar, imagine só fazer...
Interessante, porque tudo que eu já tinha lido até hoje ensina que devemos reduzir o máximo que conseguirmos, agora esse cara manda a gente desmembrar?
Mas não deixa de ser interessante, eu vou pelo menos tentar, vai que rola. c': Muito interessante esse texto, acho que vou reler mais uma cinco vezes, é bom coisas que façam a gente parar e pensar.
O chato é que já é difícil você pensar em todo o enredo em si, e agora se preocupar em evitar usar esse verbos de pensamento, seria algo como escrever tudo e na hora de reescrever desmembrar, né? Creio que depois de um tempo no próprio rascunho bruto já vai ficar mais fácil de fazer isso.
Sério, gostei muito do texto, obrigada mesmo. <3
Adorei a postagem, muito útil e eu gostei do modo como além de dar uma dica, também há exemplos de como aplicá-la. Além disso, adoro desafios! Eu ouvi dizer de uma amiga que o tio C.S., autor de As Crônicas de Nárnia, também não gostava do uso desses verbos que resumem a história, então fazia um tempo que queria retirar tais verbos da minha escrita. Esse desafio não poderia ter vindo em melhor hora!
ResponderExcluirÉ incrível como precisei ler um texto para perceber uma coisa tão óbvia. Sim, isso empobrece a estória e muitas vezes a faz parecer "acelerada" demais. Post muito útil para entender o motivo desse efeito e como evitá-lo, mesmo que não seja o foco principal.
ResponderExcluir(Esse post acabou de me tirar de uma crise de inspiração, merece uma mordida~)
Ainda bem que te ajudou :)
ExcluirWooow eu amei os conselhos. Fiquei até mesmo empolgada para escrever. Sinto que agora vai.
ResponderExcluirLiga Dos Betas trazendo ótimos conteúdos como sempre, parabéns.
Obrigada pelo comentário!
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