Por: Beatriz Goés
Também conhecido como Arco da
Transformação, é um elemento implícito da história, definido por letristas e
estudiosos da literatura ao longo de anos. Trata-se da trajetória do
protagonista ao longo do enredo. É um fato importante a ser estudado, especialmente
para escritores iniciantes, pois é como um "esqueleto" da história,
que contém elementos "necessários" para fazer a história "dar
certo". Há aspas porque, como sempre, para toda regra há exceções; ainda
assim, o Arco do Personagem é um conhecimento extremamente válido para qualquer
escritor.
Mas o que é, então, esse tal arco? É o
processo de transformação do protagonista dentro de uma história e, muitas
vezes, o que nos faz criar tanto carisma por um personagem. A possibilidade da
mudança, da redenção, da esperança é, contantemente, o que nos faz gostar tanto
de uma história.
E junto ao Arco do Personagem,
automaticamente a "Estrutura dos Três Atos" entra na conversa, pois
ambos tratam da evolução da história de forma ordenada. Vou usar um exemplo para
facilitar o entendimento: o filme Frozen (2013). Eu o escolhi porque, além de
ser uma história de fácil compreensão, acredito que a maioria de vocês tenha
visto. Como o gráfico mostra, ocorre a divisão em três atos.
Observação:
perdoem as traduções grotescas, mas não encontrei produções oficiais em
português sobre o tema, então traduzi ao pé da letra.
Primeiro Ato
- Temos, a princípio, o Incidente Inicial (Inciting Incident),
a situação que dará origem à situação maior da história. Ou seja, temos Elsa,
ainda criança, atirando, sem querer, gelo em sua irmã, Anna, a qual fica
gravemente machucada e, por temer causar maiores prejuízos a ela, Elsa decide
esconder seus poderes e omitir-se de todos.
- A partir daí tiramos a "Call to
Action" ou "Tag Question" ou Motivo da Narrativa: Elsa vai conseguir descongelar seu coração?
Isso é o que nos mantém presos à narrativa, que gera ansiedade e nos faz torcer
pela personagem. É a pergunta que vai gerar a transformação da personagem.
- A personagem, então, passa por uma
circunstância considerada o Primeiro
Ponto de Virada (1st Turning Point), o acontecimento que vai mudar
terminantemente a sua vida: revelar os seus poderes e fugir de Arendelle. Esse
momento condiz também com uma falsa libertação da personagem, o Despertar (Awakening), representado por
meio da música Let It Go.
O primeiro ato, então, é repleto de
acontecimentos que procuram despertar a curiosidade e a simpatia do leitor ou
do público perante o protagonista, um dos atos mais difíceis de serem executados.
Segundo Ato
- Como mencionado nos parágrafos
anteriores, o protagonista se depara com uma falsa paz, que representa a Metade do Caminho (Midpoint), uma parte
de tranquilidade momentânea. Esse instante é compreendido como os momentos logo
após Let It Go, e vai até quando Anna chega ao castelo de
Elsa.
- A partir de então, inicia-se a Queda (Fall) da personagem. E, por
queda, não se trata de uma queda física. Na história em questão podemos
compreender como uma queda emocional, pois Elsa passa de uma confiança absurda
em si mesma, apresentada em Let It Go, para um temor intenso após machucar sua
irmã mais uma vez.
- O último momento do segundo ato é a Experiência de Morte (Death Experience). Logicamente, é mais
um termo que deve ser compreendido na forma conotativa. Não há uma
"experiência de morte", digamos que aqui é um momento em que a
personagem aproxima-se de um colapso, seja emocional ou físico. É quando
começam a surgir mais empecilhos na sua vida e ela não consegue solucionar
nenhum. Elsa, além de machucar sua irmã mais uma vez (remetendo ao evento
causador de todo o transtorno de sua via), é atacada pelo seu próprio povo, e
por Hans, em seu castelo.
Terceiro Ato
- No Segundo Ponto de Virada, a protagonista tenta algo que nunca
tentara antes, algo completamente oposto ao seu verdadeiro caráter; no caso da
nossa personagem, ela usa seus poderes para agredir intencionalmente os seus
súditos. Tanto que até temos a frase de Hans "Elsa, não seja o monstro que
pensam que você é."
- Um constante Declínio (Descent) da protagonista é percebido: Elsa é presa e,
finalmente, vê o desastre que fez no seu próprio reino. Há um acumular de todas
as mágoas e tristezas ocorridas na trama até então, e podemos sentir a angústia
de Elsa.
- O Clímax vem logo depois, com a notícia da suposta morte da sua irmã.
Nesse instante, a nossa protagonista simplesmente não pode mais fugir: destruiu
seu próprio reino, prejudicou os cidadãos de Arendelle e causou a morte de sua
irmã. Elsa arrepende-se profundamente de ter sentido medo e escondido seus
poderes por tanto tempo.
- Quando percebe que a sua irmã está
viva, Elsa vê uma chance de recomeçar e de finalmente acertar como rainha. A
tão aguardada Transformação da
personagem ocorre quando ela decide abrir seu coração para o "calor" do
amor. Seu coração, então, derrete, igual ao reino uma vez congelado.
Então, podemos dizer que a pergunta feita
no início da narrativa foi respondida? Sim, Elsa conseguiu descongelar seu
coração. E a transformação da personagem, ocorreu? Sim, a protagonista deixou
de possuir um caráter extremamente reservado e autoprotetor para se tornar mais
afável e generosa.
Percebemos, durante o Arco do
Personagem, uma ideia implícita de 180°: o protagonista nunca terminará a
história do mesmo jeito que a inicia.
Bea, isso quer dizer que eu tenho que
seguir estritamente o Arco do Personagem e a Estrutura de Três Atos? Claro que
não. Ambas as teses foram tendências percebidas em inúmeras histórias ao longo
de toda a ficção humana, uma "fórmula" que funciona. Mas para toda
regra há exceção.
Na minha opinião, uma história não faz
muito sentido sem transformação de pelo menos um dos personagens. De que
adianta toda uma trama se a sua experiência não alterou ou afetou o personagem?
Se, em Titanic, Rose e Jack, na
famosa cena no mar, não fizessem as declarações do quanto um mudara a vida do
outro, certamente não nos sentiríamos tão emocionados assim. Histórias são
criadas a fim de nos emocionar, nos dar esperança ou um choque de realidade.
Para os que ficaram interessados nesse
modelo, recomendo, a cada filme assistido ou história lida, perguntar-se
"Qual foi a pergunta feita no início da narrativa que me deixou preso a
ela?" e "Será que houve a transformação de algum personagem?".
Parece bobagem, mas esse exercício o faz perceber que o Arco do Personagem pode
ser identificado em qualquer história.
Fontes:
Anotações próprias durante aulas de
roteiro e escrita criativa.
KIM
THOMPSON. Writing Club: Character Arc and Motivation
http://kimthompsonauthor.com/writing-club-character-arc-and-motivation/
Tem tão pouco conteúdo sobre isso internet afora, é uma pena. Obrigada por trazer um pouco aqui.
ResponderExcluirFicamos contentes por gostares do nosso blog!
ExcluirSeria muito bom um posto sobre a jornada do vilão,pois estou bloqueada para dar um jornada para o vilão da minha fanfic, sem os clichês dos vilões de desejar dominar o mundo.
ResponderExcluirVou adicionar a tua sugestão ao nosso banco de ideias :)
ExcluirNão seria o caso de aplicar a jornada do herói ao vilão?
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